• Prémio: Prémio Carreira da 2ª Edição do Prémio SCM (Sociedade Cabo-Verdiana de Música), em Ago 2023,.
• Nota biográfica: por César Monteiro Sociólogo, investigador, especialista em Ciências Musicais, a 2 Set 2023,. A música cabo-verdiana, um dos esteios maiores do nosso universo identitário e simbólico, tem sido, desde sempre, construída, reproduzida e recriada através, também, do prestimoso contributo dos compositores e intérpretes, num processo de criação e de prática musical, que a valorizam e a projetam para patamares cada vez mais elevados da cultura nacional e transnacional. Na linha dessa valiosa prestação de homens e mulheres fazedores de cultura, tendo em mira, em última análise, a fixação da memória coletiva, inscreve-se a figura incontornável de Daniel Figueira Lopes da Silva Mariano, nascido na Rua São João, Cidade do Mindelo, São Vicente, a 17 de janeiro de 1956, precisamente na casa que pertencia ao seu avô materno, o famoso Djô Figueira. Oriundo de uma família de escritores, ensaístas, poetas, músicos e artistas plásticos, Dany Mariano, nome por que é conhecido na vida musical, acompanhou os seus pais para São Nicolau transferidos, na altura, como funcionários públicos, quando contava ele apenas dois anos de idade, e, na ilha do Chiquinho, conclui a primeira classe de instrução primária. De regresso a São Vicente, Dany, filho primogénito do casal Figueira Mariano, terminaria a segunda e a terceira classe para, de imediato, prosseguir os estudos liceais nessa mesma ilha. A despeito de alguma mobilidade de um lado para outro imposta pela profissão dos pais e, outrossim, pelas circunstâncias da vida, a infância e a adolescência de Dany decorrem num ambiente de serenidade com alguma traquinice pelo meio, é certo, própria da idade, sem, todavia (passo a citar o biografado), "nunca ter faltado nada em casa dos meus pais, graças a Deus" (fim de citação). Ao ambiente de descontração, muita brincadeira e felicidade no qual viveu Dany Mariano viria juntar-se muita música que, aliás, desde tenra idade, encontrou em casa dos pais, através de rádio transístor, gira-disco e pick-up, numa altura em que, de resto, as canções de Roberto Carlos se difundiam, em S. Vicente. Do lado familiar, o avô paterno João de Deus Mariano tocava violino e violão e, assim, desde miúdo, nesse ambiente de informalidade, foi ganhando o gosto e a paixão pela música. Em 1967, quando tinha o Dany 11 anos, o seu tio paterno e poeta, Dante Mariano, que descobrira no sobrinho alguma vocação musical, ajuda-o a formar um pequeno grupo 2 chamado Los Metralhas, do qual também faziam parte os irmãos Mário, Pomba e Tólas Lima, todos eles da mesma faixa etária e geração. Nessa efémera banda, que chegou a atuar no intervalo de um baile de casamento com os instrumentos elétricos do grupo "Chave de Fenda" (Los Gatos Bravos), Dany era baterista e, mais tarde, entusiasmado com os preciosos ensinamentos de violão do seu companheiro Mário Lima, aprendeu alguns acordes e começou a cantar algumas músicas de Roberto Carlos e outros cantores de sucesso da época. Desfeita a banda, entre 1971 e 1972, Dany, mais tarde, integra Los Padritos, outro grupo musical também efémero criado pelo famoso Padre Simões, em S. Vicente, uma figura eclesiástica popular, que imprimiu grande dinamismo à música na ilha do Porto Grande e deixou uma marca indelével, nas décadas de 60 e 70 do século passado, no seio de uma geração de jovens músicos que então emergiam. A partir de abril de 1974, no período que imediatamente antecede a independência do país, Dany Mariano passa a integrar outro grupo musical, igualmente efémero, denominado Revolução, que chegou a atuar nalguns bailes e espetáculos musicais. Na verdade, a carreira musical de Dany começa em força quando, a convite do guitarrista, teclista e compositor, Antero "Tey" Barbosa, em 1974, integra o mítico conjunto musical Os Kings, fundado em julho de 1971. Após digressões por vários países africanos, europeus e americano como a Guiné-Bissau, Senegal, Portugal, Itália, França, Holanda e Estados Unidos da América e ter gravado dois discos com os Kings, em 1978, Dany Mariano resolve iniciar a sua carreira a solo em 1982 e grava o seu primeiro disco de sucesso Raizes, com arranjos de Paulino Vieira, através do qual apresenta uma proposta inovadora para a música de Cabo Verde, particularmente para o género da morna. Dois anos depois, em 1984, Dany integra, em S. Vicente, o MDR '96 Movimento de Desenvolvimento das nossas Raízes, que, mais tarde, passa a ser designado Gota d'Aga, na Galeria Nhô Djunga, que viria impulsionar o aparecimento do Festival da Baía das Gatas de que ele é, aliás, um dos seus fundadores, ao lado de Vasco Martins, Vlú, Voginha e outros companheiros de jornada. Cumprida a sua missão histórica, o grupo Gota d'Aga desaparece e surge, em 1987, outro projeto musical, o Pedra de Calçada ao qual também o Dany pertenceu. Além de exímio intérprete e show man no palco, Dany Mariano é um dos maiores compositores de sempre, que marcou particularmente as gerações dos anos 70 e 80 pela 3 sua forma descontraída de estar na música. A sua primeira composição em crioulo, "Mundo ca cré", teria sida feita em 1972. As suas composições, que privilegiam a qualidade, ultrapassam três dezenas com destaque, entre outras emblemáticas, para "Mi ê dode na bô Cabo Verde", "Na ondas di bô corpu", "Mundo ca cré", "Vida tem um so vida" e "Nha Amiga", as duas últimas composições feitas em parceria com Manel d'Novas. Gravada pela Cesária, Vida tem um só vida foi incluída na banda sonora do filme O testamento do Senhor Napumoceno. Em 2018, na anunciada ponta final da sua carreira a solo, Dany Mariano grava o seu segundo CD a solo com as dez composições mais emblemáticas do compositor que, no passado, fizeles estavam grande sucesso como "América Terra d'Hollywood", "Gata Morena", "Mi ê dôde na bô Cabo Verde", "Na Estrada d'Europa", "Sandy", "Mulata Coca-Cola" com uma roupagem nova. Considerado muito romântico e um observador atento e sensível, que aprecias as coisas belas da vida, a principal fonte de inspiração de Dany Mariano como compositor é Cabo Verde e a mulher cabo-verdiana. Nas suas composições, não privilegia nenhum género musical em especial, embora tenha composto grande mornas e coladeras gravadas, diga-se de passagem, por nomes sonantes da música cabo-verdiana como Cesária Évora, Tito Paris, Fantcha, Mariana Ramos, Gabriela Mendes, Mo Green, etc. Pai de três filhos, avô e fiel de Armazém reformado da EMPROFAC, Dany Mariano, reconhecido ativista e batalhador pela assunção dos direitos de autor, é um dos sócios fundadores da Sociedade Cabo-Verdiana de Música (SCM) que, desde a sua criação, tem dado um grande contributo, sobretudo durante os últimos cinco anos, como presidente do órgão fiscal desta entidade de gestão coletiva. Cientes, igualmente, do inegável contributo de Dany Mariano como um dos maiores autores e compositores cabo-verdianos de todos os tempos, os membros da Sociedade Cabo-Verdiana de Música elegeram-no, por unanimidade, como Prémio Carreira da 2ª Edição do Prémio SCM, no passado mês de agosto do corrente ano.
Fontes
1
DGAE - Direcção Geral da Administração Eleitoral - Cabo Verde - (2004 e/ou 2008 e/ou 2011). NB: - Locais de nascimento apenas constam no recenseamento de 2004 - Nomes sem data de nascimento, foram obtidos nos registos de recenseamento dos filhos
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